29 novembro, 2011

Quando um preso cruza o seu caminho

Imagine a cena: você está sentada numa sala de espera de uma clínica para fazer um exame. Você nota a presença e o movimento de dois policiais para lá e para cá. Daí ouve a recepcionista perguntar ao telefone se o recluso (um prisioneiro) está pronto para ser buscado.

Você pensa que não ouviu direito e se dirige para a sala de um dos exames. Quando vai trocar de sala vê um homem acompanhado pelo guarda, vestido com um roupão e com algemas nas mãos sendo levado para a mesma sala que você acabou de sair.

Filme? Não.
Hospital público? Também não.

Havia só um médico e só um técnico. Você fica à espera enquanto o prisioneiro é atendido. Estica as pernas, faz xixi e se pergunta: “Mas que raio?”.

Cabem muitas sensações e interpretações no espaço de alguns minutos. E você passa da mais completa indignação para uma inacreditável admiração. O seu primeiro instinto é: “nunca mais volto aqui” para depois ser surpreendida com o próprio pensamento: “Não é incrível? Eu vivo numa sociedade que dá a um prisioneiro o mesmo padrão de atendimento que uma pessoa que pode pagar por tal”. Porque independente do crime que ele cometeu, ter acesso a tratamento de saúde é um direito universal.

Isso te faz lembrar que embora naquele dia em especial você estivesse pagando o valor integral porque se tratava de um exame muito específico – e a autorização do Estado demoraria muito mais do que você estava disposta a esperar –, em outras circunstâncias, naquela mesma clínica, você já tinha sido atendida com a mesma atenção e pagando apenas o valor mínimo cobrado para pacientes subsidiados pelo Sistema Público de Saúde.

Também te faz descobrir preconceitos que você nem sabia que tinha. Porque de tão utópico que parece ser o conceito de “direitos iguais para todos”, você nem imaginava que ele pudesse ser posto em prática justo ao seu lado. Felizmente, entre tantos pensamentos desconexos, você voltou para casa grata por ter presenciado e refletido sobre tudo aquilo e por ver que entre tanta corrupção pelo menos alguma coisa boa é feita com os impostos que você paga. 

Um comentário:

Eduardo disse...

Não devemos esquecer que um prisioneiro é tutelado pelo estado, e como tal, deve ter sua integridade preservada. De certa maneira, o grau de civilização pode ser medido pela maneira como se trata de presos. Não é porque eles são maus e empregam métodos vis que devemos responder na mesma moeda.